O Google acha que seus produtos devem triunfar pela qualidade, não pela publicidade
Andrei D´Angel
Quando Steve Jobs anunciou sua saída da presidência da Apple, semanas atrás, lamentou-se a aposentadoria precoce de um CEO que detinha um raro talento: o de enxergar produtos de alta tecnologia pela ótica do consumidor, e não do engenheiro. Com isso, conseguiu que a Apple fabricasse itens tecnologicamente avançados, bonitos e de fácil utilização pelo consumidor médio – evitando que fossem acometidos pela “síndrome do videocassete”, aparelho cujas algumas funções só eram dominadas por “17 pessoas no mundo”, segundo Luis Fernando Verissimo em uma crônica. Jobs, por isso, era uma espécie de estranho no ninho da tecnologia: um homem de marketing num setor dominado por engenheiros e informatas.
As habilidades de marketing de Jobs, no entanto, iam além da capacidade de pensar um produto pela ótica do consumidor. Ele era capaz, também, de valer-se de seu poder persuasivo para convencer os consumidores de que os produtos da Apple eram superiores, inéditos, fabulosos – mesmo quando não passavam de (competentes) recombinações de funções desempenhadas por aparelhos concorrentes. Jobs era um bom vendedor do próprio trabalho, como mostraram suas inúmeras aparições em eventos de tecnologia da Califórnia, quando apresentava as novidades da Apple para o ano que começava.
Essa segunda habilidade marketeira de Jobs é tão ou mais difícil de ser igualada que a primeira. Facebook e Google, por exemplo, têm sido felizes, na maior parte das vezes, em criar produtos úteis e interessantes para os consumidores – mas não necessariamente em fazer o indispensável barulho a cada novidade. Em uns casos, por falta de capacidade; o anúncio das novas funções do Facebook, semana passada, tentou imitar o estilo Jobs de apresentação, mas Mark Zuckerberg não conseguiu ser nada além que uma figura sem graça sobre o palco.
Em outros casos, porém, trata-se de uma opção, digamos, “filosófica” – categoria na qual se enquadra o Google. Segundo Douglas Edwards, autor de um recente livro sobre os bastidores da empresa, os fundadores do Google sempre odiaram “a idéia de publicidade: eles acreditavam que boas ideias se venderiam sozinhas” (Folha de S. Paulo, 17/08/2011). Algo que a revista Fast Company de abril deste ano confirma:
“A persuasão ofende a crença meritocrática do Google. A empresa se tornou a maior ferramenta de busca do mundo porque construiu o melhor produto, não porque criou melhores anúncios de TV que o Yahoo.”
Uma crença que a própria revista trata como ingênua, e que acarreta prejuízos para a empresa:
“Muitos dos avanços do Google ficam desconhecidos do público porque ninguém ouviu falar deles. Os donos de iPhone sabem que o Android permite ao usuário ditar e-mails por voz? Imagine o marketing que a Apple faria disso.”
A tal filosofia do Google é perigosa. Inúmeras tecnologias superiores fracassaram por terem perdido, justamente, a batalha do marketing – seja aquela travada no campo da divulgação, da distribuição ou do preço. O Betamax era superior ao VHS, o teclado tipo DVORAK melhor que o QWERT e os Macs, mais amigáveis que os PCs – mas nenhum deles triunfou. Um bom produto é um bom começo, mas não uma garantia de sucesso.
Por isso, surpreende que uma empresa moderna, como o Google, defenda um ponto de vista tão rudimentar. Quantos bons produtos e serviços o Google não deve ter deixado de transformar em vencedores simplesmente por negar-se a badalá-los? Quão perigosa não é essa crença de que o sucesso da ferramenta de busca pode ser repetido ad infinitum em novos empreendimentos da companhia?
No avançado setor de alta tecnologia, como em todos os outros, vale uma imagem tão antiquada quanto verdadeira: tão importante quanto botar o ovo, é cacarejar.
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